Eu no cabeleleiro sábado, começo a conversar com Sandra enquanto espero a manicure. Ela me diz, em meio a outras coisas:
“ Tina, não entendo como as coisas chegaram a esse ponto, ou melhor, não sei onde foi que eu errei, acho que foi na escolha antes de nascer... não que eu tenha uma vida horrível, que viva em favela ou que passe fome, nada disso. Vivo num apto meu, em bairro de classe média mas não gosto da localização, gosto da decoração, mas tenho horror de chegar e/ou voltar para lá todo dia. Infelizmente para mim, naturalmente.
Minha vida sempre foi de trabalho, de luta, de procura, de criar filhos trabalhando, de não desistir... mas mesmo assim, quando achava que teria algum sossego, não consegui. Estou triste. Não tenho quase nada Tina, eu não tenho mais salário ou remuneração pois perdi emprego no começo do ano, e não tenho chance de arranjar outro pois a idade não permite. Pode?
Que país é esse , que relega os mais velhos ao ostracismo? Hoje vivo de migalhas vindas de marido e filhos, vivo na expectativa de uma aposentadoria que ainda não chegou (e que será uma migalha também, com certeza - palavras minhas), vivo sem dinheiro meu, justo eu: que sempre trabalhei, sustentei e mantive família enquanto era necessário. Hoje ninguém me dá nada, ao contrário: continuam a me cobrar como se eu ainda estivesse na ativa e ganhasse como sempre. Não dão o mínimo valor. Acham que saí da ATIVA por opção. E não foi, garanto. Não foi , não queria. Foi decisão alheia, daquelas que só uma " reestruturação" explica. Quando explica.
E ela continua: “Tina; agora vou vivendo tentando ser normal, virei mãe/esposa que não trabalha fora (gente: que mal há nisso?) tenho família e estou tão só, sem divisão, sem certeza, sem garantia, com tudo e sem nada... Não me respeitam mais, sabia? Eu nunca vivi essa vida, tenho tudo e tenho nada ao mesmo tempo. Tenho medo. Medo do que vai acontecer. Estou sem garantia. Eu era a minha garantia. Não sou mais. Medo do que vai faltar? Medo do que não vou ter. Medo de viver assim. Estou aqui hoje porque economizei, gosto de fazer as unhas, nem que seja uma vez por mes."
Sandra foi pintar as unhas, se dar alguma alegria, e eu fiquei imaginando como a vida dela será. Não falamos mais. Sinceramente, quase desisti de fazer as unhas, mas a manicure não tinha culpa da minha chateação. Nem Sandra , ela é realidade, dura e triste. Realidade de milhões de brasileiros. Infelizmente.
Tem pessoas que passam pela vida da gente só para trazer lições. Para nos fazer pensar, olhar para o lado, agradecer. Se mexer.
E pensar que vivemos num país que joga fora quase 30 milhões de reais só na mudança de leis...
beijos,
Tina